(Publicado pelo Jornal do Brasil)
Os países da União Europeia estão mobilizados desde o dia 22 deste mês para definir o futuro de seu parlamento regional. Evento pouco conhecido por nós, brasileiros, a eleição europeia tem o poder de definir os nomes que serão responsáveis pela coordenação do bloco em questões críticas como a crise financeira, a legislação de migração e a integração comercial dos países-membros.
Mas, por que isso nos importa? Porque ainda que os países da União Europeia não sejam mais tão importantes quanto já foram nas relações comerciais do Brasil, as decisões tomadas por lá têm o poder de impactar profundamente nossa economia e nosso estilo de vida. Em 2008, por exemplo, foi dito pela nossa Presidência que a crise internacional chegaria ao Brasil apenas como uma marolinha. Infelizmente, a marolinha foi maior do que o esperado, e desde então amargamos margens pífias de crescimento – seguindo a tendência da Europa, que até hoje não se arrumou. A política migratória, por sua vez, afeta os que gostam de viajar. Até o momento, temos o direito de passar até três meses em qualquer país da União Europeia sem nos preocuparmos com vistos. Membros dos partidos da extrema direita, como o Liberdade e Democracia e os Reformistas e Conservadores Europeus, acreditam que isto é um erro e querem impor sérias barreiras tanto ao turismo quanto à migração. Nas relações comerciais, a agricultura é um dos principais temas. Os altos subsídios garantidos pela Europa a seus produtores rurais fazem com que nossa agricultura amargue prejuízos seguidos, tendo que baixar seus preços para acompanhar os índices internacionais. Isto gera, entre outros fenômenos, um êxodo rural, que aumenta ainda mais o desemprego em nossas metrópoles. Sabendo disto, cabe a nós entender as flutuações eleitorais e o que cada partido apresenta de novo neste processo.
Primeiramente, cabe desmistificar um mito: fala-se que a extrema direita está crescendo e que isto é um mal. Inicialmente, o entendimento de direita por lá e por aqui é diferente. Por aqui, pensa-se no capitalismo. Por lá, no isolacionismo, mais barreiras e menos miscigenação. Ainda não há este crescimento suposto por nossa imprensa. É verdade que em alguns países estes radicais ganharam uma expressão nunca vista na história do Parlamento. França, Dinamarca e Áustria são exemplos. Ainda assim, em termos gerais, os partidos deste espectro permanecem do mesmo tamanho (minoritário), ou até menores, quando comparados com o resultado das últimas eleições. Um dos fatores reside na perda de espaço em nações-chave como a Holanda.
Outro mito está na mudança de rumos do Parlamento. É verdade que o Partido Popular Europeu, maior do Parlamento, sairá reduzido. Das 274 cadeiras em 2009, a tendência é fazer pouco mais de 200 deputados. Ainda assim, permanece o maior partido do bloco, e seus posicionamentos – uma reprodução regional do que prega Ângela Merkel na Alemanha – continuam ditando boa parte do que acontecerá na Europa.
Por fim, o que muda? Em termos decisórios, praticamente nada. A ordem de partidos continua praticamente a mesma, pelo menos entre os maiores: respectivamente, Partido Popular Europeu (EPP), Aliança Progressista dos Socialistas e Democratas (S&D), Aliança dos Democratas e Liberais pela Europa (Alde), e Partido Verde Europeu.
Por outro lado, em termos políticos, há uma tendência para a qual devemos estar atentos. O número de votantes é relativamente baixo. Apenas 43% dos eleitores compareceram às urnas nesta eleição, que é voluntária, diferente da nossa. Em países como a Eslováquia e a República Checa, respectivamente, 13% e 19,5% votaram. Aumentando a tendência do desejo por mudanças, é provável que mais de 10% dos eleitos não estejam filiados a nenhum partido político e, portanto, representem um grupo flutuante que pode colaborar tanto com os moderados quanto com os grupos extremistas. Não se acredita que isto influenciará os rumos da Europa de uma maneira geral, mas é possível que surpresas aconteçam em questões pontuais – principalmente no tocante à mobilidade de estrangeiros, como nós.
Por fim, a mensagem que fica é que por lá, bem como por aqui, o cidadão médio é moderado mas quer mudanças. Sente no bolso e na qualidade de vida o impacto dos maus governos e espera da classe política uma representação mais efetiva do seu interesse. Ainda assim, está desapontado e, mesmo temente sobre o futuro, tem dificuldades em crer que uma mudança no Parlamento causará algum impacto em sua vida. Que o próximo Parlamento não imponha uma distância maior entre o Brasil e a Europa, e que o exemplo do cidadão não votante não recaia sobre nós nas eleições de outubro.